Armas, Drogas e Sexo

O crime agora veste terno

No país onde o dinheiro vivo é a liturgia do poder, seguir o dinheiro ainda é o único ato de fé que restou. Armas, Drogas e Sexo não são vícios. São os três pilares do controle.

Chris Schlögl 13 de novembro de 2025

Imagem: Ilustração gerada por IA.
Imagem: Ilustração gerada por IA.

Puxa uma cadeira, o café chegou. E como toda boa conversa que começa na mesa de um balcão, o assunto acaba voltando pro mesmo ponto: quem realmente manda nesse país. A colher gira o açúcar, a fumaça sobe, e a sensação é de que a gente continua mexendo o mesmo amargo há anos. O jornalismo de verdade tinha um mandamento simples: siga o dinheiro. Quem ainda se der ao trabalho, verá que ele continua correndo por baixo das manchetes, alimentando as mesmas bocas e comprando as mesmas consciências. Só mudou o disfarce.

O bolsonarismo não inventou a lama, apenas lhe deu uniforme, púlpito e logomarca. O dinheiro vivo foi o idioma desse poder: Rachadinhas, depósitos anônimos, malas discretas, vaquinhas digitais que terminavam em cofres de campanha. E dinheiro vivo, todos sabem, só tem uma origem: o que precisa ser lavado.

Meu pai me ensinou que existem apenas três poderes no mundo: Armas, Drogas e Sexo. Anos depois, percebi que ele falava sobre controle, não sobre vício. No bolsonarismo, as Armas representam as milícias, o braço que manda, que impõe, que silencia. Não é o revólver do morro, é o contrato assinado no gabinete, o blindado do governo, o decreto que autoriza a bala.

As Drogas são o outro braço das mesmas milícias. Elas controlam o tráfico, mas os grandes traficantes já não se escondem em vielas: têm escritório, offshore, e endereço na Faria Lima. O pó vem principalmente por meio de portos e aeroportos e esse contrabando é lavado no mercado financeiro e por que o combate ao tráfico insiste em subir o morro e matar o pobre e o negro? O lucro está alimentando o tal mercado. Esse mesmo mercado, essa entidade mística que dizem “reagir mal” às decisões políticas de inclusão social, não reage ao crime, e ele lucra com o crime.

E o Sexo é a terceira engrenagem. Não o da carne, mas o do poder sobre ela. É o controle dos corpos, da liberdade, da culpa. A religião que dita quem pode gozar, como, quando e com quem. O moralismo que veste terno e legisla sobre úteros. As igrejas que aprenderam a transformar desejo em pecado e pecado em doação. Tudo movido pelo mesmo dinheiro que o Estado finge não ver.

O Brasil é governado por esses três pilares, e o dinheiro é o sangue que corre entre eles. Ele passa pelos templos, escorre nos contratos públicos, seca nos bolsos de quem ainda acredita em meritocracia. A cada escândalo, surge uma nota oficial, um versículo e um discurso de indignação fabricada. A engrenagem gira. O crime, agora, veste terno, fala em Deus e fecha negócio com o mesmo cinismo com que abençoa a próxima eleição.

As manchetes sobre o novo projeto de lei do PL, de Tarcísio e Derrite, são apenas o capítulo mais recente dessa teologia da violência. Querem oficializar a exceção, transformar o medo em política pública e a bala em argumento. A imprensa repete sem espanto, os fiéis aplaudem, o mercado agradece.

Enquanto isso, o jornalismo que sabia seguir o dinheiro virou memória. Hoje, repete versões oficiais e chama isso de equilíbrio. Mas a neutralidade, num país em que o poder se lava em sangue e dízimo, é só outro nome pra cumplicidade.

Siga o dinheiro. Ele ainda está lá, entre o templo e o quartel, passando pela corretora e pela campanha. Só mudou de roupa.

Quem serviu esse café?

Chris Schlögl
Chris Schlögl

É jornalista e criador do Café, Amigos e Sinceridades, um espaço onde opinião e café se misturam sem pressa. Prefere o amargor da verdade ao açúcar da conveniência. Escreve para provocar conversa, não consenso. Acredita que jornalismo é janela, não vitrine.

Aviso legal: O conteúdo acima é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando necessariamente a opinião do portal Café News. A publicação foi realizada por meio de colaboração voluntária e o conteúdo é de inteira autoria e responsabilidade do colaborador.

PUBLICIDADE